Saúde Mental https://saudemental.blogfolha.uol.com.br Informação para superar transtornos e dicas para o bem-estar da mente Tue, 14 Dec 2021 02:30:19 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Pensamentos intrusivos afetam mais pessoas com TOC e podem levar a abuso de substâncias, explica psiquiatra https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/2021/11/25/pensamentos-intrusivos-afetam-mais-pessoas-com-toc-e-podem-levam-a-abuso-de-substancias-explica-psiquiatra/ https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/2021/11/25/pensamentos-intrusivos-afetam-mais-pessoas-com-toc-e-podem-levam-a-abuso-de-substancias-explica-psiquiatra/#respond Thu, 25 Nov 2021 10:00:19 +0000 https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/files/2020/10/lu2-300x215.jpg https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/?p=1302 Os pensamentos intrusivos são involuntários e fazem a pessoa acreditar que vai perder o controle de alguma forma.

Eles não correspondem à realidade nem aos desejos de quem os vivencia. Geralmente dão a impressão que o indivíduo vai cometer um ato que considera abominável, como ferir outra pessoa ou a si mesmo. Ou, ainda, se ele fizer ou deixar de fazer alguma coisa, algo catastrófico pode acontecer.

“É muito importante entender que pensamentos intrusivos são involuntários. As pessoas que os vivenciam normalmente sentem repulsa por eles”, ressalta a psiquiatra Flávia Batista Gustafson.

“Existem muitos tipos de pensamentos intrusivos, mas os tópicos comuns incluem pensamentos inadequados de cunho sexual, pensamentos sobre relações interpessoais, com conteúdo de traição, por exemplo, pensamentos religiosos que são opostos e inadmissíveis pela crença da pessoa, e pensamentos relacionados a violência contra outras pessoas ou si mesmo”, explica.

Apesar de poderem afetar qualquer pessoa, são mais comuns em quem tem transtornos como ansiedade, estresse pós-traumático e especialmente TOC (transtorno obsessivo-compulsivo).

“Essas pessoas [com TOC] também têm maior probabilidade de passar mais tempo pensando sobre as implicações desses pensamentos e são mais propensas a superestimar a probabilidade dos resultados temidos se vierem a se concretizar, o que acaba por retroalimentar o problema. Forma-se um ciclo vicioso em que os pensamentos intrusivos estão sempre voltando, o que causa muito sofrimento”, conta Gustafson.

Com a pandemia da Covid-19 mais controlada e a volta do trabalho presencial e dos eventos sociais, é comum que pessoas que já tinham pensamentos intrusivos anteriormente fiquem mais vulneráveis a eles.

“Os pensamentos intrusivos a respeito da contaminação pelo vírus da Covid-19 ou até outras doenças podem ser amplificados, e a pessoa pode experimentar grande sofrimento ao se ver obrigada a frequentar círculos profissionais e sociais novamente”, observa.

Sem um tratamento adequado, quem enfrenta esse fenômeno pode acabar recorrendo ao uso de álcool e outras drogas para tentar distrair a mente. “A pessoa se ‘medica’ com o álcool, ou menos frequentemente com outras drogas ilícitas, em busca de um relaxamento e alívio momentâneo dos sintomas”, diz Gustafson.

“O problema é exatamente esse: um alívio momentâneo. A seguir vem a parte indesejada, que é a piora dos sintomas. A pessoa então passa a ingerir mais álcool para voltar a sentir-se aliviada, levando a um perigoso abuso e uma potencial dependência, o que consequentemente adiciona uma nova camada de problemas para se lidar.”

Leia a seguir a entrevista com a psiquiatra.

O que são pensamentos intrusivos e como eles surgem?
Pensamentos intrusivos são pensamentos indesejados que aparecem do nada. Eles podem ser desencadeados por estresse do dia a dia, mas também podem ser sintomas de um transtorno mental. Geralmente eles são desagradáveis e até perturbadores, o que pode fazer com que as pessoas não procurem ajuda num primeiro momento por se sentirem envergonhados por esses pensamentos.

Os pensamentos intrusivos são involuntários e não têm relação com a realidade ou os desejos de uma pessoa. As pessoas não agem de acordo com esses pensamentos, muito pelo contrário, elas geralmente os consideram horríveis e inaceitáveis.

Esses pensamentos podem ser persistentes e causar angústia significativa em algumas pessoas. Frequentemente, quanto mais as pessoas tentam se livrar desses pensamentos, mais eles persistem e mais intensos se tornam.

Você poderia citar um exemplo de pensamento intrusivo que seja comum?
É muito importante entender que pensamentos intrusivos são involuntários. As pessoas que os vivenciam normalmente sentem repulsa por eles.

Existem muitos tipos de pensamentos intrusivos, mas os tópicos comuns de pensamentos intrusivos incluem: pensamentos inadequados de cunho sexual, pensamentos sobre relações interpessoais, com conteúdo de traição, por exemplo, pensamentos religiosos que são opostos e inadmissíveis pela crença da pessoa, e pensamentos relacionados a violência contra outras pessoas ou si mesmo.

Os pensamentos intrusivos são comuns em transtornos como ansiedade, estresse pós-traumático, transtorno bipolar e TOC (transtorno obsessivo-compulsivo). Por que os pacientes diagnosticados com esses transtornos costumam ter esse tipo de pensamento?
Pessoas com diagnóstico de transtornos mentais (nesse caso, principalmente aquelas com TOC) têm maior probabilidade de julgar seus pensamentos intrusivos como maus, imorais ou perigosos.

Essas interpretações geralmente levam a uma forte reação emocional negativa, o que amplifica a força percebida dos pensamentos intrusivos, elevando assim o foco sobre eles.

Essas pessoas também têm maior probabilidade de passar mais tempo pensando sobre as implicações desses pensamentos e são mais propensas a superestimar a probabilidade dos resultados temidos se vierem a se concretizar, o que acaba por retroalimentar o problema. Forma-se um ciclo vicioso em que os pensamentos intrusivos estão sempre voltando, o que causa muito sofrimento.

Qual é a diferença entre pensamento intrusivo, alucinação e delírio?
As alucinações e delírios são sintomas bastante diferentes dos pensamentos intrusivos, e costumam estar presentes em transtornos psicóticos.

As alucinações podem ocorrer em qualquer modalidade sensorial (auditiva, visual, olfativa, gustativa e tátil), mas as auditivas são de longe as mais comuns. É uma percepção que parece completamente real para a pessoa, mas que não está acontecendo. As alucinações auditivas são geralmente experimentadas como vozes, familiares ou não familiares, que são percebidas como distintas dos próprios pensamentos da pessoa.

A definição de delírio é um pouco diferente, embora também envolva a experiência de algo que parece real, mas não é. É uma crença obviamente falsa, mas mesmo assim o indivíduo que a experimenta pensa que é absolutamente verdadeira. Essa pessoa vai acreditar firmemente no delírio, mesmo quando repetidamente mostradas evidências contrárias.

Tanto as alucinações quanto os delírios são distúrbios, na realidade. São experiências que parecem reais para quem está sofrendo com elas, mas não têm conexão com a realidade.

Agora, com a pandemia mais controlada, as pessoas estão retomando o trabalho presencial e os eventos sociais. É comum que algumas pessoas tenham pensamentos intrusivos por medo de contaminação por Covid-19? Ou mesmo por que ficaram muito tempo em isolamento e estão enfrentando uma espécie de agorafobia?
Certamente. As pessoas que já sofriam com pensamentos intrusivos antes da pandemia agora estão muito mais vulneráveis à medida que o mundo vai se abrindo novamente ao “novo normal”.

Os pensamentos intrusivos a respeito da contaminação pelo vírus da Covid-19 ou até outras doenças podem ser amplificados, e a pessoa pode experimentar grande sofrimento ao se ver obrigada a frequentar círculos profissionais e sociais novamente.

Muitas dessas pessoas encontraram um certo conforto emocional na situação de isolamento e do home office durante a fase mais crítica da pandemia e podem sentir muita dificuldade em enfrentar o mundo novamente.

É comum uma pessoa que tenha pensamentos intrusivos e que ainda não tenha tido um diagnóstico correto recorra ao uso de drogas e álcool? Quais são os perigos que essa prática pode acarretar?
Quando falamos em pensamento intrusivos que causam muito sofrimento, sempre lembramos do risco aumentado do abuso de substâncias, especialmente o álcool.

A pessoa se “medica” com o álcool, ou menos frequentemente com outras drogas ilícitas, em busca de um relaxamento e alívio momentâneo dos sintomas.

O problema é exatamente esse: um alívio momentâneo. A seguir vem a parte indesejada, que é a piora dos sintomas. A pessoa então passa a ingerir mais álcool para voltar a sentir-se aliviada, levando a um perigoso abuso e uma potencial dependência, o que consequentemente adiciona uma nova camada de problemas para se lidar.

Com um diagnóstico correto e tratamentos com psiquiatra e psicólogo é possível controlar esses pensamentos?
Pensamentos intrusivos nem sempre são o resultado de uma condição médica. Aliás, a maioria das pessoas os têm de vez em quando. No entanto, para muitas pessoas, pensamentos intrusivos podem, sim, ser um sintoma de um problema de saúde mental, como TOC ou o transtorno de estresse pós-traumático.

Esses pensamentos também podem ser um sintoma de problemas neurológicos, como uma lesão cerebral, demência ou mal de Parkinson, por exemplo. Por isso um diagnóstico bem feito é imperativo.

A melhor maneira de gerenciar pensamentos intrusivos é reduzir a sensibilidade da pessoa a esses pensamentos e seu conteúdo. O tratamento vai ser individualizado a cada pessoa, mas, em linhas gerais, o médico psiquiatra vai fazer o diagnóstico e prescrever a medicação mais indicada.

Paralelamente, é fundamental a abordagem com a psicoterapia, sendo a TCC (terapia cognitivo comportamental) a mais indicada. Por último, e não menos importante, a pessoa deve ser orientada a seguir um estilo de vida saudável, com alimentação nutritiva, atividade física e higiene do sono, o que vai somente agregar ao seu bem-estar geral.

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Estudo da Unifesp aponta alto consumo de álcool entre idosos https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/2021/10/15/estudo-da-unifesp-aponta-alto-consumo-de-alcool-entre-idosos/ https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/2021/10/15/estudo-da-unifesp-aponta-alto-consumo-de-alcool-entre-idosos/#respond Fri, 15 Oct 2021 13:40:06 +0000 https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/files/2021/10/4a8a0fafb79ccefb084f2808d7c25f219f6cfdf004f8ba55c93c6179d039d032_5ae6c0011da91-300x215.jpg https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/?p=1245 Agência Fapesp – Estudo conduzido pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) indica que aproximadamente um em cada quatro brasileiros (23,7%) com 60 anos ou mais consome álcool. Além disso, 6,7% (aproximadamente 2 milhões de idosos) relatam ter ingerido no último mês várias doses em uma ocasião –padrão de consumo abusivo conhecido como “binge drinking”, ou seja, o uso excessivo de uma só vez. E 3,8% (mais de 1 milhão) costumam beber, em uma semana típica, quantidades que podem colocar em risco sua saúde.

Para estimar a prevalência dos padrões de consumo de álcool da população geral idosa, o grupo da Escola Paulista de Medicina (EPM-Unifesp) fez uma análise dos dados da linha de base do Estudo Longitudinal da Saúde dos Idosos Brasileiros (ELSI-Brasil), com uma amostra de 5.432 brasileiros acima de 60 anos. Também se buscou avaliar os padrões de consumo de álcool em idosos da atenção primária (primeiros atendimentos médicos). Para isso, foram utilizados dados da triagem inicial do ensaio clínico realizado em sete Unidades Básicas de Saúde (UBS) com 503 participantes.

Em ambos os estudos foram identificados fatores sociodemográficos, comportamentais e de saúde associados aos diferentes padrões de consumo. A ingestão de álcool foi mais comum na região Sudeste e na atenção primária, quando comparada à população idosa geral. Em ambos os grupos estudados (idosos em geral e atenção primária), os homens relataram maior consumo de álcool (tanto em quantidade quanto em relação ao consumo no padrão “binge”), bem como os mais jovens e aqueles com maior escolaridade.

Financiada pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) por meio do projeto temático “Intervenções inovadoras frente a problemas relacionados ao consumo do álcool no Brasil: busca de novas abordagens para uma antiga questão de saúde pública”, a pesquisa e seus desdobramentos foram recentemente publicados nos periódicos científicos Substance Use & Misuse e BMJ Open.

De acordo com Tassiane de Paula, primeira autora dos artigos, “é fundamental entender esse problema para propor estratégias para redução do consumo de álcool entre os idosos”.

Intervenção de baixo custo 
O grupo desenvolveu uma proposta de Intervenção Breve para Idosos (IBI) e elaborou um protocolo para testar a efetividade dessa intervenção na atenção primária, administrada por agentes comunitários de saúde, com apenas 6% de recusa entre os primeiros 80 participantes recrutados.

“As evidências sugerem que intervenções breves são eficazes na redução do consumo de álcool entre adultos mais velhos. No entanto, a eficácia dessas intervenções quando realizadas por agentes comunitários de saúde em um ambiente de atenção primária à saúde é desconhecida. Até onde sabemos, este será o primeiro ensaio clínico randomizado a examinar isso”, escreveram as pesquisadoras no artigo publicado.

Duzentos e quarenta e dois indivíduos considerados bebedores de risco serão recrutados e alocados aleatoriamente para receber o atendimento usual (lista de espera) ou atendimento usual mais uma intervenção breve realizada por agentes comunitários de saúde treinados em UBS que fazem parte do SUS (Sistema Único de Saúde).

O estudo Alcohol and ageing: rapid changes in populations present new challenges for an old problem pode ser lido em aqui.

E o artigo Brief interventions for older adults (BIO) delivered by non-specialist community health workers to reduce at-risk drinking in primary care: a study protocol for a randomised controlled trial está disponível em aqui.

Com informações da Assessoria de Comunicação da Unifesp.

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É possível ter um transtorno psicológico e viver bem, diz psicóloga Ana Gabriela Andriani https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/2021/10/10/e-possivel-ter-um-transtorno-psicologico-e-viver-bem-diz-psicologa-ana-gabriela-andriani/ https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/2021/10/10/e-possivel-ter-um-transtorno-psicologico-e-viver-bem-diz-psicologa-ana-gabriela-andriani/#respond Sun, 10 Oct 2021 10:00:18 +0000 https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/files/2021/10/WhatsApp-Image-2021-10-09-at-12.42.10-300x215.jpeg https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/?p=1208 O que é ter saúde mental? Para a OMS (Organização Mundial da Saúde), a saúde mental é um estado de equilíbrio psíquico, físico e que envolve questões sociais. Não é definida apenas pela ausência de uma doença.

A psicóloga Ana Gabriela Andriani concorda com esse conceito. “É possível ter um transtorno ou um distúrbio de personalidade e ter uma vida equilibrada. Considerando que uma vida equilibrada não significa uma vida sem momentos de desestabilização, de tristeza e de desorganização”, observa.

Andriani ressalta que todos nós, tendo ou não um diagnóstico de transtorno mental, sofremos oscilações emocionais ao longo da vida. Para evitar as crises, quando for necessário, é preciso buscar tratamento medicamentoso com um psiquiatra e fazer psicoterapia.

Ela explica que a terapia é um caminho para o autoconhecimento. “É um trabalho em que a pessoa vai poder se conhecer melhor, entender o que está sentindo, o que se passa com ela e qual é o sentido disso que está acontecendo com ela, de onde veio isso. E aí ela vai conseguir elaborar e pensar também como reagir.”

Neste domingo (10) é celebrado do Dia Mundial da Saúde Mental. A data foi criada em 1992 por iniciativa da Federação Mundial para Saúde Mental com o objetivo de educar e conscientizar a população sobre a importância do tema e diminuir o estigma social.

Na entrevista a seguir, a psicóloga fala sobre a ideia que temos a respeito do que é uma mente sã e sobre os impactos culturais e históricos no psicológico da sociedade.

A depressão já foi chamada de “mal do século”. Atualmente, o burnout tem sido associado à geração millennial (pessoas nascidas entre 1980 e 1995). Como você vê essa relação entre transtornos e gerações? 
Sem dúvida existe uma correlação entre o momento social e histórico e os transtornos psíquicos que são produzidos ali. Porque os transtornos psíquicos são constituídos a partir das condições de vida das pessoas, da cultura da sociedade e do que acontece ali em termos sociais. Então, por exemplo, na época do Sigmund Freud (1856-1939), que era uma época de grande repressão sexual, o transtorno mais comum, ao qual ele de dedicou a estudar, era a histeria. Em períodos pós-guerra, principalmente depois da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) e da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), surgiam neuroses de guerra, que são caracterizadas por depressão e por grandes traumas. Hoje, num momento que a gente tem uma cultura que valoriza muito a aceleração e a alta performance, a gente vê crises de ansiedade, burnout e crises de pânico como sendo os transtornos mais vigentes.

Agora, para a gente conseguir elaborar, simbolizar o está vivendo, a gente precisa se conhecer. Saúde psíquica também tem a ver com autoconhecimento. Porque o autoconhecimento amplia a nossa capacidade de pensar sobre nós mesmos e sobre o mundo, sobre as nossas relações, sobre tudo que a gente está vivendo.

Receber um diagnóstico de transtorno psicológico pode ser um baque para algumas pessoas. É possível continuar tendo uma vida feliz e equilibrada mesmo convivendo com um transtorno e tendo que tomar medicações para o resto da vida? 
Sim, é possível ter um transtorno ou um distúrbio de personalidade e ter uma vida equilibrada. Considerando que uma vida equilibrada não significa uma vida sem momentos de desestabilização, de tristeza e de desorganização.

É importante considerar que a gente vai oscilar emocionalmente ao longo da vida. Em quem tem um transtorno ou um distúrbio de personalidade também vai sofrer oscilações. Mas é possível evitar uma crise expandida ou mesmo viver crises com o uso de medicamentos receitados por um psiquiatra. Mas não só isso. Também por meio da realização de uma psicoterapia, que é um trabalho em que a pessoa vai poder se conhecer melhor, entender o que está sentindo, o que se passa com ela e qual é o sentido disso que está acontecendo com ela, de onde veio isso. E aí ela vai conseguir elaborar e pensar também como reagir.

É importante dizer que o remédio sozinho não vai dar conta de tornar uma pessoa mais saudável. Ele é muito importante porque traz uma estabilidade, mas é o trabalho de psicoterapia que vai propiciar à pessoa se conhecer melhor, expandir sua capacidade de pensar sobre ela mesma, sobre o que está vivendo, e é isso que vai poder transformá-la.

Com a pandemia da Covid-19, o assunto saúde mental está sendo muito debatido. Você acha que a visibilidade que o tema tem recebido tem ajudado a diminuir o estigma em relação aos transtornos psicológicos? Ou ainda temos muito caminho pela frente? 
Acredito que sim, que os assuntos relacionados à saúde mental e aos transtornos psicológicos têm sido mais divulgados. Por exemplo, neste ano e no ano passado, por conta da pandemia, falou-se bastante sobre crises de casais, sobre relações familiares, sobre burnout, crises de pânico. Vários psicólogos se disponibilizaram a fazer atendimentos gratuitos.

Acho que o tema tem sido mais debatido e as pessoas têm tido mais informações sobre isso, o que é muito bom, porque as pessoas passam a ter uma ideia de que elas não precisam só cuidar do corpo, elas precisam cuidar também da saúde mental.

Aliás, faz parte do conceito saúde esse entrelaçamento entre corpo e psique. Acredito que tanto as empresas como área do esporte, todas essas instâncias têm se voltado mais para o cuidado com a saúde mental.

Casos como o da atleta Simone Biles, que deixou de disputar algumas provas nas Olimpíadas para priorizar a saúde mental, jogam uma luz sobre a necessidade de as pessoas respeitarem seus momentos. Você acha que estamos no fim da era do “trabalhe enquanto eles dormem”? 
O que vêm mudando é que tanto as instituições como as pessoas vêm percebendo a grande necessidade de cuidar da saúde mental. Estão percebendo que essas questões relacionadas à saúde mental não podem ser deixadas de lado, porque senão a pessoa que está lá na empresa não trabalha, o atleta não tem bom desempenho, ninguém consegue ficar com uma sensação de bem-estar e viver suas vidas de forma mais saudável.

Acho que a gente vive tempos em que é exigido alta performance, alto desempenho, até uma perfeição do corpo, do trabalho, do cuidado com os filhos e uma aceleração. Tudo isso é naturalmente produtor de ansiedade. Acho que isso não vai mudar, pelo menos por enquanto. A gente vive numa sociedade com essas características.

O que eu tenho impressão que vem mudando é a necessidade de cuidado com a saúde mental atrelado ao trabalho, atrelado à alta performance e ao bom desempenho. Então, por exemplo, no esporte, vem se percebendo a necessidade de se cuidar, de saber como esse atleta está emocionalmente nas suas relações familiares, de como ele está em termos de ansiedade, e das necessidades emocionais dele para que ele consiga estar bem para desempenhar um bom trabalho. Não é que agora vai ser cuidar da saúde mental e deixar a questão do desempenho de lado. A questão, e acho que essa é a grande mudança, é que vamos cuidar das duas coisas ao mesmo tempo, o psicológico atrelado ao físico e ao trabalho, ao desempenho profissional de maneira geral.

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No Dia da Saúde Mental, saiba onde encontrar atendimento psicológico gratuito https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/2020/10/10/no-dia-da-saude-mental-saiba-onde-encontrar-atendimento-psicologico-gratuito/ https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/2020/10/10/no-dia-da-saude-mental-saiba-onde-encontrar-atendimento-psicologico-gratuito/#respond Sat, 10 Oct 2020 10:00:30 +0000 https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/files/2020/03/2702b99f013fa9411914f32816be4e41789f270846142409a51e7ac09570aaa3_5e6e033617da9.jpg https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/?p=394 O Dia Mundial da Saúde Mental é lembrado todos os anos em 10 de outubro. Foi criado em 1992 por iniciativa da Federação Mundial para Saúde Mental com o objetivo de educar e conscientizar a população sobre a importância do tema e diminuir o estigma social.

Neste ano, a data é celebrada em meio à pandemia no novo coronavírus, que tem provocado sintomas de depressão e ansiedade em parte da população.

Pensando no impacto da quarentena na saúde mental, o Instituto Vita Alere, que desenvolve projetos e pesquisas nessa área da saúde, disponibilizou um site que mostra onde e como buscar serviços gratuitos de psicologia e psiquiatria.

A iniciativa, que teve apoio técnico do Google, traz um mapa virtual, com contatos para atendimento online, e um mapa presencial, com endereços de Caps (Centro de Atenção Psicossocial), Caism (Centro de Atenção Integrada à Saúde Mental ), hospitais psiquiátricos, ONGs e clínicas de faculdades.

O site também indica o atendimento de acordo com o tipo de paciente: para o público em geral, para profissionais da saúde e para grupos específicos, como pessoas que perderam parentes e amigos por Covid-19idososgestantes e adolescentes.

Para facilitar qual tipo de ajuda buscar, o site tem um guia que explica como funciona o tratamento com um psicólogo, o que faz um psiquiatra e em quais situações se deve procurar um hospital psiquiátrico, por exemplo.

Uma pesquisa divulgada em maio e coordenada pelo Instituto de Comunicação e Informação em Saúde (Icict), da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), em parceria com a UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e a Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) revelou alterações de comportamento na população brasileira durante as primeiras semanas do isolamento social.

O estudo que contou com a participação de 44.062 pessoas de todo o território nacional mostrou que 40% dos entrevistados se sentiram tristes ou deprimidos e 54% se sentiram ansiosos ou nervosos frequentemente. Os percentuais foram ainda maiores entre adultos jovens (na faixa de 18 a 29 anos): 54% e 70%, respectivamente.

Na segunda-feira (5), uma pesquisa divulgada pela OMS (Organização Mundial da Saúde) indicou que o atendimento em saúde mental foi reduzido ou interrompido em 93% dos países do mundo.

A pesquisa foi realizada de junho a agosto de 2020, entre 130 países nas seis regiões da OMS.

Mapa da Saúde Mental
mapasaudemental.com.br

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Departamento de psicologia da UFSC promove grupo de apoio online para quem deseja parar de fumar https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/2020/10/08/departamento-de-psicologia-da-ufsc-promove-grupo-de-apoio-online-para-quem-deseja-parar-de-fumar/ https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/2020/10/08/departamento-de-psicologia-da-ufsc-promove-grupo-de-apoio-online-para-quem-deseja-parar-de-fumar/#respond Thu, 08 Oct 2020 10:00:40 +0000 https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/files/2020/10/tabagismo-300x215.jpg https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/?p=376 O Laboratório de Psicologia Básica e Aplicada (LPCOG) e o Laboratório de Psicologia Social da Comunicação e Cognição (LACCOS) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) promovem, ao longo do mês de novembro, um grupo de apoio para pessoas que querem parar de fumar.

A iniciativa faz parte do projeto de extensão Programa de Cessação do Tabagismo e será realizado virtualmente, de forma gratuita, por meio da plataforma Google Meet.

As sessões contarão com técnicas de psicoterapia cognitivo-comportamental que auxiliam na tentativa de parar de fumar e na manutenção da cessação do tabagismo.

Os encontros ocorrerão nas quatro quintas-feiras do mês de novembro (dias 5, 12, 19 e 26), às 16h, com duração de aproximadamente 1h30.

Em maio, uma pesquisa coordenada pelo Instituto de Comunicação e Informação em Saúde (Icict), da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), em parceria com a UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e a Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) mostrou que os voluntários relataram, além de sintomas depressivos e de ansiedade, aumento no consumo de cigarros e de álcool durante as primeiras semanas do isolamento social provocado pela pandemia do novo coronavírus.

Entre os fumantes, 28% aumentaram cerca de dez cigarros por dia e 6% mais de 20. O percentual de aumento de cerca de dez cigarros por dia foi maior entre as mulheres (32%) do que entre os homens (24%).

Os encontros do grupo da UFSC serão coordenados pelas psicólogas Emanuely Pereira e Fernanda Lopes e acompanhados pelos estudantes de psicologia Caio Lessa e Marcelo Neves. O dentista Rubens Rodrigues Filho e a pneumologista Leila Steidle também fazem parte da equipe.

As inscrições para participar do grupo da UFSC vão até o dia 20 de outubro. O interessado deve enviar um email com o assunto “Inscrição” para vidasemcigarro.ufsc@gmail.com ou uma mensagem por WhatsApp para o número (47) 99620-4049.

Os requisitos básicos exigidos são: ter aparelho eletrônico, fone de ouvido, conexão à internet e privacidade no ambiente em que acompanhará as sessões.

Antes do início, os inscritos terão de responder a um questionário individual e realizar uma entrevista (também online).

Segundo Fernanda Lopes, uma das coordenadoras do grupo, os voluntários devem ser preferencialmente de Florianópolis, já que o projeto está vinculado à Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis. “Contudo, estamos nos organizando enquanto equipe para atendermos pessoas de todo o Brasil”, afirma.

 

Grupo de Cessação do Tabagismo
Quando às quintas-feiras de novembro (dias 5, 12, 19 e 26), às 16h, com duração de aproximadamente 1h30
Onde virtualmente, pela plataforma Google Meet
Inscrições até 20 de outubro –o interessado deve enviar um email com o assunto “Inscrição” para vidasemcigarro.ufsc@gmail.com ou uma mensagem por WhatsApp para o número (47) 99620-4049
Quanto gratuito

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Sentir raiva na quarentena está associado a imprevisibilidade e sensação de impotência, dizem especialistas https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/2020/06/29/sentir-raiva-na-quarentena-esta-associado-a-imprevisibilidade-e-sensacao-de-impotencia-dizem-especialistas/ https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/2020/06/29/sentir-raiva-na-quarentena-esta-associado-a-imprevisibilidade-e-sensacao-de-impotencia-dizem-especialistas/#respond Mon, 29 Jun 2020 10:00:51 +0000 https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/files/2020/06/098a3f5316dd876ed020fe69d0ceb5c92068540a88b460acda3285405ded912e_5ae6e76851cea.jpg https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/?p=194 “O que mais dá raiva é levar o negócio a sério e ver que tem gente andando na rua como se nada estivesse acontecendo. Essa é uma das coisas que mais me tira do sério”, desabafa José Henrique Silva, 40.

O chef de cozinha atua no setor de festas e eventos e está sem trabalhar desde o início da quarentena causada pela pandemia do novo coronavírus.

“Percebi já nas duas primeiras semanas de isolamento social que meu humor mudou completamente. Ficava irritado com qualquer coisa, agora estou um pouco mais calmo. Mas no começo foi bem difícil”, diz.

José Henrique conta que chegou a brigar com vizinhos que se reuniram com familiares em casa. Ele mora em Cotia (a 31 km de São Paulo), em uma vila residencial com seis casas, onde os moradores dividem as áreas comuns.

“Meus vizinhos são evangélicos e, segundo eles, decidiram fazer uma oração em família. Mas trouxeram cachorro, gato, periquito, a mãe, a sogra, a casa encheu de gente”, diz.

“O pior é que essa vizinha é enfermeira e trabalha em pronto-socorro, ou seja, ela sabe muito bem os cuidados que devemos ter. Mesmo assim, passou por cima de tudo. Porque ela não desrespeitou só a mim, ela desrespeitou a todos que moram aqui.”

A psicóloga Fabíola Freire Saraiva de Melo, coordenadora do curso de psicologia da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), explica que a raiva está associada com a sensação de impotência.

“Toda vez que ficamos impotentes diante de alguma situação, sentimos raiva. É como uma criança que se sente frustada e tem um ataque de birra. É uma força, um sentimento muito forte que toma conta da pessoa, uma sensação de descontrole”, afirma Fabíola.

Para a psicóloga, a imprevisibilidade causada pela pandemia do novo coronavírus pode aumentar a irritabilidade e a raiva nas pessoas.

“Numa semana fala-se em “lockdown”, na outra em reabertura. Além disso, estamos sendo privados de ter contato com quem amamos, de vivenciar o luto, muitos estão sem poder trabalhar“, observa.

É o que tem enfrentado a aposentada Solange Ribeiro, 63. Ela mora no Rio de Janeiro e desde março não pode ver as filhas Stephanie, médica, e Thalita, jornalista, e o neto Théo.

“Quando começou o corona, eu estava de malas prontas para viajar para o interior de São Paulo visitar minha família. Sempre via minhas filhas e meu neto, que moram no Rio também”, conta. “Na época, achei melhor cancelar a viagem e esperar mais uns 15 dias. Só que desses 15 dias, estou até hoje aqui.”

A raiva, para Solange, vem da incerteza de não saber o que vai acontecer nos próximos dias.

“Aqui, no Rio, parece que nunca termina o pico da doença. A curva está sempre subindo. Então isso está deixando todo mundo com raiva, não só eu, mas também meus amigos, principalmente o pessoal da mesma faixa etária. Tenho amigas que estão depressivas, longe da família. São pessoas ativas, que gostam de sair, sem depender de ninguém e, de repente, agora têm que depender dos filhos para trazer alguma coisa, ou de amigos”, relata.

“Minhas filhas não podem vir aqui, porque uma é médica e a outra é repórter de rua. O Théo está com 1 ano e 4 meses. Vejo eles pela janela, pelo vídeo todos os dias, aí fico matando a saudade. E fico sozinha, não tem ninguém na minha casa. Fico conversando com quem? Com o Buddy, meu cachorro. Vendo live, vendo filme, ouvindo música, mas tem uma hora que tudo cansa.”

Desde o início da pandemia na capital fluminense, Solange tem tomado todos os cuidados contra o coronavírus. Há um mês ela perdeu uma amiga para a Covid-19.

“É angustiante, porque vou da cozinha para a sala, da sala para o quarto. Nos últimos dias comecei a descer com o Buddy para ele passear, mas sempre com máscara, aquele cuidado todo. Tá muito complicado aqui no Rio com esse abre e fecha. Cada hora o governo fala uma coisa. Isso vai gerando uma raiva, uma angústia. Porque você cria uma expectativa que vai acontecer, que vai terminar tudo isso e nada. E a saudade da família é muito grande.”

O psiquiatra Diego Tavares, pesquisador do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), afirma que o cenário atual favorece as alterações de humor.

“A pandemia é um prato cheio para tudo isso. É uma situação estressante, abrupta e inesperada”, diz.

Apesar de o sentimento de raiva ser comum nesse contexto de imprevisibilidade, ele pode estar associado a doenças como depressão e transtorno bipolar se for constante. Nesses casos, muitos confundem o sintoma como se fosse um traço de personalidade.

“A irritabilidade do deprimido é mais introspectiva, não tem agressividade. A pessoa fica ranzinza, reclamona, pessimista. É mais inócua para que está perto”, afirma. “Já na bipolaridade, a irritabilidade é mais agressiva, explosiva e com tendência a brigas.”

Diego afirma que a irritabilidade também pode aparecer em pacientes com transtorno de ansiedade. Nesse caso, está associada ao excesso de preocupação e medo.

Os sintomas mais comuns da raiva são o tom de voz alterado, a falta de paciência e o hábito de bufar ou suspirar intensamente.

“À medida que o indivíduo fica mais nervoso, ele vai perdendo o filtro e começa a brigar com a família, com os colegas de trabalho e mesmo com desconhecidos na rua ou no trânsito”, diz.

Para quem convive com uma pessoa que está nervosa, o psiquiatra dá um conselho. “Nunca pergunte se a pessoa está com raiva. É fácil identificar que ela está. O melhor é sair de perto, a pessoa irritada precisa ficar afastada para se acalmar.”

Se a irritabilidade é um sintoma constante e começar a atrapalhar o relacionamento com outras pessoas, é importante procurar ajuda de um psicólogo ou de um psiquiatra, recomenda o médico.

José Henrique, o chef de cozinha, conta que começou a fazer terapia online e meditação durante a quarentena. “Eu já tinha feito terapia há muito tempo, mas parei. Era algo que queria muito voltar a fazer e tive oportunidade agora.”

Para desestressar, ele diz que também redecorou a casa. “Pintei, troquei os móveis, comprei plantas. Cozinhei muito também, mas estou estudando decoração, saindo um pouco do foco da cozinha”, diz.

Solange também tem cozinhado e mudado o ambiente onde está confinada. “Para aliviar, tenho feito comida. Faço bolo, faço pão caseiro. Agora vou pintar o apartamento. Já lixei as paredes e vou começar a pintar”, conta.

A psicóloga Fabíola ressalta a importância de mudar a perspectiva nesse momento para aprender a lidar com a raiva e com a frustração.

“Enquanto a pessoa está se debatendo de raiva, ela não consegue aceitar essa situação que todos nós estamos enfrentando. É preciso ressignificar essa experiência e aprender com ela”, explica.

“Não é brincar de ser poliana, de enxergar um lado bom nisso. Mas a gente precisa usar a criatividade e encontrar formas de lidar com a realidade”, observa.

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Compulsão por compras pode estar associada a outros transtornos como bipolaridade, explica psicóloga https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/2019/12/06/compulsao-por-compras-pode-estar-associada-a-outros-transtornos-como-bipolaridade-explica-psicologa/ https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/2019/12/06/compulsao-por-compras-pode-estar-associada-a-outros-transtornos-como-bipolaridade-explica-psicologa/#respond Fri, 06 Dec 2019 05:00:14 +0000 https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/files/2019/12/black-300x213.jpg https://saudemental.blogfolha.uol.com.br/?p=15 Uma blusinha em promoção no site, um objeto para a casa, um presente para um amigo. Não é pelo produto em si, mas pela satisfação de comprar. Só que depois da euforia, vem a culpa.

Quem tem compulsão por compras, a chamada oniomania (a palavra deriva dos termos gregos “oné”, que significa aquisição, e “manía”, estado de loucura), enfrenta constantemente um sofrimento emocional por ter perdido o controle, explica a psicóloga Tatiana Zambrano Filomensky, coordenadora do Programa para Compradores Compulsivos do Pró-Amiti (Ambulatório Integrado dos Transtornos do Impulso), que faz parte do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas,  da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo).

Tatiana explica que, ao contrário do consumista, que gosta de exibir o que adquiri, o comprador compulsivo tenta esconder esse comportamento.

“Ele não expõe, não demonstra, porque sabe que aquilo acarreta sérios problemas na vida dele”, afirma.

A psicóloga conta que mais de cem pessoas se inscrevem anualmente para receber tratamento no Pró-Amiti. O programa é gratuito e inclui sessões de terapia em grupo, atendimento psiquiátrico, além de orientação financeira e familiar.

“Agora, no fim de 2019, estamos chamando pessoas que se inscreveram no início do ano”, revela.

A oniomania foi relatada pela primeira vez na década de 1920 pelo psiquiatra alemão Emil Kraepelin e começou a ser tratada como um transtorno do impulso nos anos 1990.

Leia a seguir a entrevista com a psicóloga.

Como uma pessoa pode identificar se tem compulsão por compras? 
O compulsivo entra num modo de sofrimento. Isso é o que o diferencia de um consumista. O sofrimento emocional ocorre por ele ter perdido o controle. Ele tenta se impor limites, mas não consegue cumpri-los. É totalmente diferente do consumista. O consumista pode até se endividar, comprar mais do que deveria, mas ele mostra para todo mundo, quer expor o que comprou, pôr na rede social. Já o compulsivo, não. Ele não expõe, não demonstra, porque sabe que aquilo acarreta sérios problemas na vida dele.

Quais são os sintomas da oniomania? 
Um dos sintomas é a preocupação excessiva com as compras. A pessoa fica irritada, inquieta ou ansiosa se for impedida de comprar. Ela tem uma vontade progressiva de comprar, passa a comprar cada vez mais para se satisfazer. E há uma sensação de satisfação emocional que tem por trás disso. Então ela procura uma anestesia emocional.

Não é só pelo produto em si. Porque o comprador compulsivo pode comprar para ele mesmo ou para dar de presente. O que importa para ele de fato é o ato de comprar.

Antes da compra tem uma sensação de excitação, de fissura, de realizar o ato. E logo após há uma sensação de prazer, que muitas vezes vem seguida por culpa, arrependimento.

Isso faz com que a pessoa entre num modo de rebaixamento das emoções em que ela não se sente bem. E o próprio estado emocional mais entristecido, arrependido, culpado, faz com que a pessoa busque em outro momento comprar de novo, para ter satisfação mais uma vez.

A compulsão por compras pode estar relacionada a outras doenças, como a depressão? 
Sim. A compra compulsiva dificilmente vem sozinha. Na maioria das vezes, vem acompanhada de episódios tanto depressivos, em que a pessoa acaba buscando na compra uma satisfação, uma tentativa de melhorar o seu humor, como em estados de ansiedade mais excessivos, em que a pessoa descarrega na compra essa agitação.

Pode se manifestar no transtorno bipolar também. A pessoa com transtorno bipolar pode também ter um problema com compras compulsivas. Por isso é muito importante fazer um diagnóstico, principalmente em relação ao transtorno bipolar. Porque nesse caso a pessoa tem uma fase de depressão e outra de estado eufórico. Quando ela está no estado eufórico, gastar demais é um dos sintomas. Então se a pessoa só compra em um estado de euforia, ela não tem oniomania, ela só tem transtorno bipolar. Mas se ela compra nos estados de depressão, ou mesmo em um estado de humor mais equilibrado, aí a gente tem as duas doenças ao mesmo tempo.

É comum uma pessoa com compulsão por compras apresentar outros hábitos compulsivos, como vício em jogo? 
Algumas pessoas até apresentam outras compulsões, mas não é a maioria. Assim como a gente tem a questão com outras doenças psiquiátricas, como depressão e ansiedade, também pode acontecer de a pessoa ter a compra relacionada com uma questão alimentar, que é uma dependência de comida.

No Pró-Amiti, já tivemos casos de vício em jogo, de cleptomania [impulso de furtar objetos], de tricotilomania [impulso de arrancar o próprio cabelo], de automutilação, de “skin picking”, que é quando a pessoa cutuca a pele. São comportamentos impulsivos que podem aparecer.

O que não acontece, que as pessoas têm uma falsa ideia, é de que há uma migração. “Ah, eu tratei a compra e agora vou ficar viciada em comida”, por exemplo. Não é assim que funciona. A pessoa já apresenta [a compulsão], o ponto é que alguma coisa pode estar mais evidente. A compra está mais evidente naquele momento. Aí a pessoa começa a controlar a compra e vem à tona a questão da comida. Mas não surge porque a pessoa desenvolveu uma nova compulsão.

Datas como o Natal ou a Black Friday podem servir como gatilhos para o comprador compulsivo? 
Toda e qualquer promoção, época de Natal, aniversários, datas comemorativas, tudo isso tem um apelo comercial que atinge todas as pessoas. No comprador compulsivo, como ele tem um desequilíbrio em relação ao consumo, isso pode provocar um descontrole mais intenso. Não é que ele se planeja para gastar na Black Friday. Ele já vem gastando como sempre e aí, nessa época, isso fica muito mais intenso porque tem um apelo da mídia muito grande. Então vem aquela sensação de “como eu não vou participar? Eu estou perdendo”.

Como o comprador compulsivo pode buscar ajuda?
Ele deve procurar um psicólogo e explicar seus hábitos de consumo, os problemas que foram adquiridos ao longo do tempo. Porque não é um problema que acontece só uma vez, ou só por um período. Geralmente é um problema que a pessoa carrega por décadas. Porque compra uma vez, se descontrola, aí a família vem, ajuda e resolve. Aí passa um tempo, compra mais e se endivida de novo.

O endividamento, eu falo bastante, embora não seja um critério de diagnóstico, mas é presente em 99% dos casos que a gente trata no Pró-Amiti. E isso é uma das coisas que mais gritam no ambiente familiar.

Então procurar ajuda para falar sobre isso é um passo importante, porque as pessoas procuram ajuda, às vezes, para outras coisas. Elas vão procurar um médico falando que estão com um quadro de depressão, com um quadro de ansiedade, mas não falam que gastam, que compram. Falar sobre isso com um psicólogo ou com um psiquiatra é muito importante.

O trabalho da reeducação financeira também faz parte. O descontrole financeiro não é a causa do problema, porque a causa do problema de fato é emocional, mas a reeducação financeira é muito importante para que as pessoas passem a olhar para o dinheiro de uma forma diferente.

Como identificar se uma pessoa da família é compulsiva e ajudá-la?
Você percebe que a pessoa sempre chega com coisas, com sacolas, que passou a fazer compras sozinha. Ela não compartilha mais desse momento, que é um momento prazeroso o consumo. Só que o comprador compulsivo deixa de comprar na presença de outra pessoa, ele passa a comprar escondido. Principalmente quando as questões financeiras vêm à tona, como as dívidas, a dificuldade de pagar os cartões de crédito. São sintomas que vão demonstrando que a pessoa está perdendo o controle em relação ao consumo.

O melhor a fazer é conversar, mostrar que isso é um problema, que ela não escolhe [comprar], que ela não é uma pessoa sem vergonha, sem caráter, que está gastando o dinheiro de forma desequilibrada, mas que é um problema. E que tem tratamento.

A própria internet hoje facilita e ajuda muito a busca por conhecimento. Então buscar realmente o tratamento com psicólogo, falar sobre isso, procurar um médico psiquiatra.

Há remédios que reduzem um pouco a impulsividade, a fissura, ajudam no controle do humor, se o paciente for bipolar. Falar com um médico é bastante importante. Não vai ter uma pílula que vai fazer a pessoa parar de comprar, mas vai ajudar.

Como é o tratamento no Pró-Amiti? 
O tratamento é gratuito, composto tanto do tratamento psiquiátrico como do psicológico. A pessoa deve se inscrever pelo site. Quando ela for chamada, vai passar por uma triagem em que a gente avalia se realmente ela é uma compradora compulsiva.

Se for confirmado, ela passa por toda a nossa seleção de triagem, de investigação, porque nós somos um grupo de pesquisa. Depois disso, ela vai receber um tratamento médico e psicológico.

No tratamento psicológico, a gente trabalha desde as questões que envolvem o motivo de comprar compulsivamente, quando que isso virou um problema, por que essa pessoa compra de um jeito que virou uma doença. A gente tem o trabalho de orientação familiar e de orientação financeira concomitantemente com o tratamento psicológico.

O tratamento é em grupo e tem em torno de 20 sessões de psicoterapia, o que dura mais ou menos uns seis meses. A gente faz a avaliação no início e no final do tratamento.

Quais são as principais queixas do paciente quando chega ao Pró-Amiti? 
O endividamento, as brigas familiares, a perda de controle sobre o que compra. Tem caso de paciente que demitido às vezes por justa causa, porque acabou pegando o dinheiro da empresa.

Existe cura para a oniomania? 
Assim como as dependências químicas, existe controle. Assim como as dependências químicas, a compra compulsiva é considerada uma dependência do comportamento. E para dependências não se fala em cura, fala-se em controle, em estabilidade. Reconhecer gatilhos que levam a comprar compulsivamente, que estão pautados, na maioria das vezes, nas razões emocionais, no desequilíbrio emocional, em que a pessoal busca na compra um remédio para uma questão emocional, para ter uma sensação de anestesia.

Pró-Amiti
Endereço
R. Dr. Ovídio Pires de Campos, 785, Cerqueira César, região central

Telefone 2661-7805 (horário de atendimento telefônico: segunda a quarta, das 10h às 16h, e sexta, das 9h às 15h)
Link para inscrição proamiti.com.br/contato
O tratamento é gratuito.


 

 

 

 

 

 

 

 

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